Planos passados para o futuro

now_watchpor Eduardo Cupaiolo

Chegou o final do ano. Chegou e já passou. Foi a hora de seguir as tradições de boa sorte e prosperidade. Sete ondas foram puladas, lentilhas comidas, vestiu-se branco e calcinhas amarelas dependendo dos desejos para o Ano Novo.

Uns passaram anônimos na multidão da praia para ver os fogos e viram também os de fogo. Outros nas sacadas com seus familiares e amigos – termos, por vezes, conflitantes -, outros na companhia apenas de si mesmos, no meio do mato balançando na rede e olhando as estrelas.

Os que puderam, passaram o reveillon num restaurante chicão de um hotel mais chicão ainda, deliciando-se com a delicadeza dos champagnes de Champagne. Outros, passaram no Bar do Chicão, bem longe de qualquer hotel, celebrando com sidra, ponche ou uma breja gelada.

Houve festa embalada por orquestra de cordas, mas também por corda de berimbau, por beatbox, por Beatles Forever, Banda Eva e pela Ivete. No mar e na terra. Em volta de um faisão, de um peru, ou só mesmo, de uma asinha do frango.

Enfim, teve de tudo. Mas quaisquer diferenças acabam quando falamos de planos. Bilionários, milionários, ricos, nouveaux riches, classe A, B, C, D, E, F, turística e econômica, busão. Numerada, arquibancada, cadeira cativa. Todos nós e nóis tudu. Todo mundo. Ou quase todo mundo, fez planos e promessas para o Ano Novo.

Promessas que sempre começam com a memorável frase “No ano que vem eu vou…” seguida de: parar de fumar, perder um milhão de quilos, aprender a falar inglês, aprender a falar português, cuidar mais da saúde, trabalhar menos, ser mais feliz, ganhar mais dinheiro, gastar menos dinheiro, ligar para a minha mãe, lembrar que a minha mãe existe…. e por aí vão.

O que todo mundo sabe é que a coisa não vai. Não vai mesmo. Basta tentar lembrar das promessas de 31 de dezembro de 2012.

- Lembrar? Lembrar do quê?

- Das promessas de 31 de dezembro de 2012!

- Como?? Num lembro nem do que comi ontem na hora do almoço!

É a Síndrome do “Ano que vem eu vou. E não vai. E não foi”.

Quem precisa de um reveillon para mudar, não muda. Diz que vai mudar mas não muda. Quem disse que ia emagrecer no ano que vem e lotou o prato no dia 31 “só pra migaranti” entra o ano com uma indigestão a mais. E 2 quilos a mais. Depois diz que vai começar na segunda, mas não começa nem na primeira segunda, nem na segunda segunda, nem na última.

Quem disse que ia parar de fumar, mas às 7 da manhã do Dia Primeiro acorda desesperado só para o último cigarrinho, vai acabar com o maço, com o pacote que ficou no armário da cozinha e depois vai passar a semana indo de meia em meia hora na padoca comprar no varejão só mais um… só mais um.

Enfim, quem já começa adiando para o dia 2, porque dia 1o. ainda é ano passado, vai deixar para na volta das férias, depois para depois do Carnaval, depois para depois da Semana Santa…do Dia das Crianças, para enfim decidir que melhor mesmo é deixar para o Ano que vem!

Ri não, ri não. Somos todos assim. As ligações reconciliatórias ficam para amanhã pois hoje a tarifa não compensa. Ir lá também não compensa, o desvio de trajeto é muito grande para passar na casa dele, na dela, na da minha mãe, na daquele amigo, muito menos na daquele ex-amigo.

E é assim, bem assim que caminha a humanidade com passos de formiga e sem vontade como cantou ou poeta. Sobram planos e promessas. Sobram desculpas. Só não sobra uma coisa. Não sobra vontade. Só isto. Não falta tempo, não faltam planos, não faltam promessas. Só falta vontade.

Se não é apenas falta de vontade pergunte para aquele teu amigo que no ano passado perdeu 10Kg, começou a andar e depois a andar mais, depois a correr, a acordar mais cedo, a dormir mais cedo, cortou gordura, caloria, carne vermelha, parou de fumar, e dia 31 (do ano passado) correu a São Silvestre quando há um ano nem conseguia amarrar o sapato sem o auxílio de um balão de oxigênio.

Pois é. Nas organizações também chegou a hora das promessas, corporativamente chamadas de Reuniões de Planejamento. Sessões em que primeiro revemos o que foi planejado para o ano passado contra o que ocorreu no ano passado.

Sessões em que a conjuntura será a maior responsável pelo desajuste entre o planejado e o real. O dólar esteve muito baixo. Os juros, muito altos. A crise na Síria abalou o mercado. A mariposa bateu suas asas na floresta amazônica. A concorrência foi muito acirrada. O mercado esteve praticamente parado. Nosso produto, muito caro. As margens, muito pequenas. Os prazos, muito apertados. Os clientes, muito exigentes.

Situação que me leva a algumas conjecturas:

… Não foram exatamente estas, ou quase estas, as desculpas que demos no ano passado, no retrasado, e no outro, e no outro, e assim para trás até a primeira sessão de planejamento logo depois do Dilúvio Universal?

… Não é exatamente para enfrentar desafios e dificuldades e explorar possibilidades e oportunidades que  fazemos planejamento?

… Por que o erro do Plano é sempre a realidade, nunca o Plano? Por que o problema é sempre as circunstâncias externas nunca as internas? Sempre do Plano, nunca de quem elaborou o Plano, nem de como planejou?

… Por que não planejamos o ano que vem, pelo menos, em setembro deste ano em vez de em fevereiro ou março do ano que vem e perdemos 3 meses em vez de ganhá-los?

… Por que só revemos o Plano agora, no começo deste ano, quando ele já está no IML? Só quando o dito cujo já bateu as botas, em vez de checarmos seu pulso diariamente?

Enfim, porque repetiremos neste ano os mesmos erros que vimos cometendo todos esses anos?

Quais sejam?

Primeiro. O pior de todos: não planejamos.

…. por que dá muito trabalho. Demanda muito esforço e não temos tempo para desperdiçar com isto.

Parabéns! Descobrimos uma metodologia muito mais eficiente de administrar um negócio: ir tocando conforme o vento sopra, tomando decisões apressadas e imediatistas, vendendo o almoço para comprar o jantar. Atirando pra tudo quanto é lado.

Contando com a sorte. Acendendo velas pro santo para fechar aquele contrato ou estamos fritos. Optando por simplesmente arriscar tudo no 17 vermelho.

Legal! Para no fim descobrir que houve um monte de esforços e recursos desperdiçados em canoas furadas e que se perdeu o bonde do sucesso enquanto gastávamos tempo olhando para o lado errado.

… por que acreditarmos que planejar não adianta nada, afinal, todas as vezes que planejamos, nada que planejamos aconteceu.

Parabéns! Descobrimos alguns excelentes exemplos do que é planejar mal ou errado, ou mal e errado. Melhor agora é parar de culpar a disciplina de planejar e planejar direito.

…. por que a realidade teima em não obedecer o nosso plano.

Parabéns. Acabamos de descobrir que planejamento não determina a realidade. Apenas procura interpretá-la. Antecipar tendências. Criar cenários. Sim cenários. Várias possibilidades. Das super-hiper-mega-otimistas de crescimento de 1.237%, e também as mais realistas de crescimento menores assim como as que considerem estagnação e até uma descida sem freios ladeira abaixo com agressiva redução de receitas e/ou das margens.

Segundo. Resolvemos determinar a realidade, o mercado, a atuação da concorrência e as reações do cliente.

Subestimamos a concorrência. Dizemos que vamos conquistar uma fatia do mercado, uma grande de preferência, esquecendo que os concorrentes também estão planejando a conquista da mesma fatia, ou ainda, de fatias maiores. A nossa, inclusive.

Superestimamos nossas forças e o mercado. Determinamos que cresceremos 30% quando nunca, nunquinha crescemos nem 10 e o nosso mercado não vai crescer nem 5.

Ignoramos nossas fraquezas crônicas. Marketing vai continuar sem falar com Vendas, ambos sem desintegrados com a Produção que, por falar nisto, não fala com Logística.

Ignoramos o cliente. Não falamos com ele, não perguntamos o que ele quer. E se perguntamos não ouvimos. E se ouvimos não acreditamos. Se acreditamos, não respondemos. Afinal, cliente não sabe nunca o que precisa. Nós é que sabemos. Sabemos tudo, o que ele quer, como quer, quanto vamos cobrar e quanto ele vai ficar feliz em pagar apenas para garantir nossas margens e o meu bônus de final de ano.

Terceiro. Ignoramos as vozes de quem sabe para ouvirmos apenas as nossas.

Contratamos high potential’s, enchemos a empresa de MBAs, reunimos dezenas, centenas, talvez milhares de cabeças pensantes enfrentando a realidade do dia-a-dia no dia-a-dia, e ainda somamos outras tantas num callcenter que ouve o resultado de nossas “maravilhosas estratégias” o dia inteiro o ano inteiro. Mas na hora de planejar reunimos nóis cinco. Os Iluminados. Os que sabem tudo, os que conhecem tudo. Só que erraram tudo ano passado.

Enfim…, fica muito claro que falta um bom planejamento. Um feito com uma metodologia eficiente, com ouvidos atentos às vozes externas e internas, com olhos abertos à realidade, com uma visão coerente de quem somos, em que mercado atuamos, quais nossas forças e nossas fraquezas, nossas ameaças e nossas oportunidades – uma simples análise swot.

Um planejamento que nos indique caminhos, alternativas, mas que não esteja impresso em mármore ao ponto de ser tornar uma amarra que nos impeça de mudar de rumos e aproveitar oportunidades não previstas ou de desviarmos de icebergs pelo caminho. Um bom plano que seja mais bússola do que mapa.

Mas além disto tudo, falta vontade. Afinal, quem tem vontade, também planeja. Mas também acorda cedo todos os dias e vai à luta.Vai à luta, e transforma plano em realidade.

Eduardo Cupaiolo é Diretor e Consultor da PeopleSide.

Leia a versão deste artigo em espanhol em http://wp.me/PsVfc-a4